terça-feira, 7 de janeiro de 2014

A Sangue Frio e o Caso Nardoni

Post original de 27 de junho de 2010, do blog Paulo Coelho não é Literatura!

A melhor parte de se ter um blog é que, ao contrário do jornalismo, não se precisa ter compromisso com o factual. Pode-se falar sobre o que quiser, quando quiser.

Na verdade, o que eu vou comentar agora tem gancho factual, mas ele já passou, por isso a justificativa acima.


Durante o julgamento do casal Nardoni eu estava lendo "A Sangue Frio", de Truman Capote. O livro é um clássico do jornalismo literário e todo jornalista que se preze tem que ler... se não este, pelo menos outro livro do Capote... é uma referência para quem quer fazer o que eu me esforço pra fazer aqui...

O livro, só pra contextualizar e ligar as duas histórias, fala sobre o assassinato de uma família ordinária numa cidadezinha pacata do Meio-Oeste americano...

Apesar da história ser boa, é o que menos importa no livro. O que o torna grandioso é a forma como a história é contada.

Capote dá detalhes de todas as situações, desde o crime, a fuga e o envolvimento dos criminosos, a reação das pessoas da cidade diante do crime, a reação dos próprios assassinados, e amarra a trama de uma forma que só seria possível se tivesse entrevistado todos os envolvidos em todos os cenários (o que não ocorre com a família durante o assassinato em momentos em que algumas pessoas da família estão sozinhas)

Foram anos de pesquisas, entrevistas, mas parte desta história é literatura, ficção necessária para amarrar o texto... Muita gente acha que não, mas aí voltamos à discussão mais infeliz da literatura brasileira - Capitu traiu ou não traiu Bentinho? Pra mim, irrelevante... importante é como Machado de Assis arma a sua trama..

Voltando ao Capote, a história foi para o cinema, ganhou Oscar e tudo, mas não tem a mesma narrativa de Capote, que sai da narrativa em terceira pessoa para primeira pessoa de um jeito muito habilidoso e envolvente. O filme tem como mérito a exposição da amizade entre Capote e um dos criminosos, com o qual ele teria se envolvido emocional e sexualmente. Tem também uma fotografia linda, e linhas horizontais belíssimas (não sei se tem um nome técnico pra isso... tipo o plano americano, que pra mim era só uma foto de meio corpo...rsss... valeu, Kris...)

Fiquei pensando, por ocasião do julgamento dos Nardoni, que logo deve aparecer alguém querendo contar esta história, mas infelizmente os casos policiais parecem não merecer mais, não pelo menos nas últimas décadas, o tratamento que Capote comprovou que podem ter. Com sangue sim, com muita força, com muito impacto, mas também com muita poesia, muito cuidado e um certo aspecto humano que, por mais chocante que seja, levanta reflexões acerca do que é e onde pode chegar o tal ser humano.


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