Quando era criança, vivia em um lugar onde tudo era estático. A escola, os amigos, a casa, a cidade eram sempre os mesmos. E isso me incomodava. Nada de novo acontecia para movimentar o dia. Um professor que vinha de outra cidade, um novo aluno, uma bomba, uma tragédia. Nada.
E dentro de mim o desejo de mudança era latente. O que me libertava e transformava o meu mundo em algo maior eram os livros, com suas grandes aventuras, viagens pelo mundo, monstros, espíritos, foguetes, balões, amores sem fim.
Morria de inveja de um dos meus amigos que, por conta da profissão do pai, mudava de cidade com muita frequência. Na minha cabeça, o Beto era um cara de muita sorte. Quando me deparei com a primeira grande mudança em minha vida, no final dos anos 90, ainda na adolescência, me vi apavorada com a possibilidade de me distanciar dos meus amigos e, aos poucos, perder contato com eles. Mas, só por ora.
A escolha da profissão também provocava esses mesmos anseios: no jornalismo, nada é igual todo dia, eu pensava. Se nos primeiros três anos fazer matérias parecidas ainda não me incomodar, depois disso é o vai e vem de horários e cargos que não vai me deixar dormir todo dia no mesmo horário. Mesmo com a rotina de trabalho imposta pelos métodos alheios. Sim, tem gente que quer engessar o jornalismo, e faz tempo.
Mas essa falta de limites, horários, regras na minha vida, criadas por mim para não ser igual nunca - e antes, por meus pais que nunca tiveram hora para nada em casa - me tornaram uma pessoa completamente desorganizada.
E chegou um momento na minha vida que tudo o que eu queria é que ela fosse igual, por longos períodos. Tudo o que eu queria era poder fazer planos e, quando chegasse a hora, meses depois, eles pudessem se concretizar porque a minha vida podia sim ser organizada.
Nessa tentativa de me disciplinar, nesses últimos quatro anos, e viver a monotonia e não o caos, todas as mudanças de rumo e ritmo me fizeram mal. Descobri que agora as mudanças me desgastam, me desorientam, me bagunçam por dentro por um tempo longo. E até conseguir reencontrar um novo lugar, para meu assombro, tudo começa a mudar novamente.
É como aquelas piadinhas sem graça da vida que resolve realizar seus desejos depois que você já perdeu as esperanças e se conformou com o que tinha. É como os sarcasmos do destino, que faz o que quer e quando quer, ignorando as vontades de sua vítima. É como uma gargalhada sonora dos deuses que você tanto atormentou para que a vida fosse renovada a cada dia... Bem feito pra mim!! Pensasse bem antes de implorar tanto!!
Muda-se os tempos, mudam-se as vontades
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.
( Luís de Camões)
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