sexta-feira, 21 de março de 2014

O amor, a dor e a esperança de Florbela Espanca

Dias atrás, fiz uma postagem com meu poema preferido da escritora portuguesa Florbela Espanca. Percebi que muitos amigos não a conheciam, apesar de serem leitores com bom repertório. Eu a conheci graças à coleção Pocket da editora L&PM, um livrinhos de poesias dela comprado em uma estação do metrô de São Paulo, entre uma viagem de outra de Bauru a Peruíbe, nos idos anos 1990.Leio e releio, e gosto cada vez mais. Hoje, trago outros três textinhos dela. E um pouco de sua história. 


Florbela nasceu na Vila Viçosa, no Alentejo, em Portugal, em 1894, filha de João Maria Espanca com a empregada da família, Antónia da Conceição Lobo.

Como rebento ilegítimo, sua certidão traz “pai incógnito”, mas quando ficou órfã, aos 14 anos, passou a ser criada e educada pelo pai e a madrasta.  Os pais de Florbela ainda tiveram um segundo filho, Apeles, nascido três anos depois dela.
Cursou Letras e Direito em Lisboa depois de casada pela primeira vez, passou por três divórcios e muitas decepções amorosas, todas elas relatadas em seus textos nascidos no Simbolismo. 

Escreveu para jornais e revistas, entre eles o diário Portugal Feminino, e tem mais livros publicados postumamente do que em vida.

Teve muitos problemas psicológicos, sofreu demais com a perda do irmão em um acidente de avião e acabou morrendo no dia 08 de dezembro – o mesmo de seu nascimento – em 1930, com apenas 36 anos.
Suas poesias falam da dor de existir, dos dissabores do amor, de solidão e da esperança de um dia ser plenamente feliz. 

“Amar”
Eu quero ama, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além... 
Mais este e aquele, o outro e a toda gente... 
Amar! Amar! E não amar ninguém! 
Recordar? Esquecer? Indiferente!... 
Prender ou desprender? É mal? É bem? 
Quem disse que se pode amar alguém 
Durante a vida inteira é porque mente! 
Há uma primavera em cada vida: 
É preciso cantá-la assim florida, 
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar. 
E se um dia hei de ser pó, cinza e nada 
Que seja a minha noite uma alvorada, 
Que eu saiba me perder... pra me encontrar...

"Exaltação"
Viver! Beber o vento e o sol! 
Erguer Ao Céu os corações a palpitar! 
Deus fez os nossos braços pra prender, 
E a boca fez-se sangue pra beijar! 
A chama, sempre rubra, ao alto, a arder!... 
Asas sempre perdidas a pairar, 
Mais alto para as estrelas desprender! 
A glória! A fama! O orgulho de criar! 
Da vida tenho o mel e tenho os travos
No lago dos meus olhos de violetas, 
Nos meus beijos extáticos, pagãos! 
Trago na boca o coração dos cravos! 
Boémios, vagabundos, e poetas:
- Como eu sou vossa Irmã, ó meus Irmãos!

"Voz que se cala"
Amo as pedras, os astros e o luar 
Que beija as ervas do atalho escuro, 
Amo as águas de anil e o doce olhar 
Dos animais, divinamente puro. 
Amo a hera, que entende a voz do muro 
E dos sapos, o brando tilintar 
De cristais que se afagam devagar, 
E da minha charneca o rosto duro. 
Amo todos os sonhos que se calam 
De corações que sentem e não falam, 
Tudo o que é Infinito e pequenino! 
Asa que nos protege a todos nós! 
Soluço imenso, eterno, que é a voz
Do nosso grande e mísero Destino!

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