Dias atrás, fiz uma postagem com meu poema preferido da escritora portuguesa Florbela Espanca. Percebi que muitos amigos não a conheciam, apesar de serem leitores com bom repertório. Eu a conheci graças à coleção Pocket da editora L&PM, um livrinhos de poesias dela comprado em uma estação do metrô de São Paulo, entre uma viagem de outra de Bauru a Peruíbe, nos idos anos 1990.Leio e releio, e gosto cada vez mais. Hoje, trago outros três textinhos dela. E um pouco de sua história.
Florbela nasceu na Vila Viçosa, no Alentejo, em Portugal, em 1894, filha de João Maria Espanca com a empregada da família, Antónia da Conceição Lobo.
Como rebento ilegítimo, sua certidão traz “pai incógnito”, mas quando ficou órfã, aos 14 anos, passou a ser criada e educada pelo pai e a madrasta. Os pais de Florbela ainda tiveram um segundo filho, Apeles, nascido três anos depois dela.
Cursou Letras e Direito em Lisboa depois de casada pela primeira vez, passou por três divórcios e muitas decepções amorosas, todas elas relatadas em seus textos nascidos no Simbolismo.
Escreveu para jornais e revistas, entre eles o diário Portugal Feminino, e tem mais livros publicados postumamente do que em vida.
Teve muitos problemas psicológicos, sofreu demais com a perda do irmão em um acidente de avião e acabou morrendo no dia 08 de dezembro – o mesmo de seu nascimento – em 1930, com apenas 36 anos.
Suas poesias falam da dor de existir, dos dissabores do amor, de solidão e da esperança de um dia ser plenamente feliz.
“Amar”
Eu quero ama, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além...
Mais este e aquele, o outro e a toda gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disse que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar.
E se um dia hei de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que eu saiba me perder... pra me encontrar...
"Exaltação"
Viver! Beber o vento e o sol!
Erguer Ao Céu os corações a palpitar!
Deus fez os nossos braços pra prender,
E a boca fez-se sangue pra beijar!
A chama, sempre rubra, ao alto, a arder!...
Asas sempre perdidas a pairar,
Mais alto para as estrelas desprender!
A glória! A fama! O orgulho de criar!
Da vida tenho o mel e tenho os travos
No lago dos meus olhos de violetas,
Nos meus beijos extáticos, pagãos!
Trago na boca o coração dos cravos!
Boémios, vagabundos, e poetas:
- Como eu sou vossa Irmã, ó meus Irmãos!
"Voz que se cala"
Amo as pedras, os astros e o luar
Que beija as ervas do atalho escuro,
Amo as águas de anil e o doce olhar
Dos animais, divinamente puro.
Amo a hera, que entende a voz do muro
E dos sapos, o brando tilintar
De cristais que se afagam devagar,
E da minha charneca o rosto duro.
Amo todos os sonhos que se calam
De corações que sentem e não falam,
Tudo o que é Infinito e pequenino!
Asa que nos protege a todos nós!
Soluço imenso, eterno, que é a voz
Do nosso grande e mísero Destino!
No final, parece simples como respirar.
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